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segunda-feira, 17 de março de 2014

PSDB tem jogo do bicho como aliado

Do Diário do Pará

Criminosos ligados ao jogo do bicho fizeram campanha e podem ter contribuído até financeiramente para a eleição do prefeito de Belém, Zenaldo Coutinho, do PSDB. É isso o que se pode concluir dos diálogos ocorridos, em 2012, entre o empresário João Monteiro Vidal, mais conhecido como “Jango”, e vários interlocutores, entre eles o presidente do diretório municipal do PSDB de Belém, Fabrício Gama. Segundo a polícia, “Jango” era um dos comandantes do Parazão, a central de apostas que reunia as principais bancas de bicho de Belém. Nos diálogos, ele pede votos para Zenaldo, aparenta comandar propaganda de rua em favor do tucano e, junto com Fabrício, comemora a eleição do novo prefeito.

Os diálogos de “Jango” com outros supostos bicheiros e com Fabrício Gama foram grampeados pela polícia durante as investigações que culminaram na operação “Efeito Dominó”, realizada em setembro do ano passado. Quase 50 pessoas foram presas durante a operação, entre elas “Jango” e o empresário carioca Luizinho Drumond, que, segundo a polícia, era sócio oculto do Parazão.

”Jango”, Luizinho e os demais supostos chefes da jogatina da cidade estão sendo processados criminalmente por exploração do jogo do bicho, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, crime contra a economia popular. “Jango” é presidente da escola de samba Rancho Não Posso Me Amofiná. Luizinho Drumond é patrono da escola de samba Imperatriz Leopoldinense, do Rio de Janeiro, que homenageou o Pará no carnaval de 2011, no primeiro ano de governo de Simão Jatene (PSDB). Coincidência ou não, Fabrício é agora o presidente da Liga das Escolas de Samba do Grupo Especial de Belém, anteriormente presidida por Waldir Fiock, também preso na operação Dominó, sob a acusação de integrar o comando do Parazão.

‘MEU PADRINHO’

O DIÁRIO teve acesso a alguns dos diálogos grampeados pela polícia. Eles revelam uma relação pra lá de amistosa entre “Jango” e Fabrício, que chega a tratar “Jango” como “meu padrinho”. Em uma ocasião, Fabrício tenta tranquilizar “Jango”, afirmando que não era verdadeira uma pesquisa que apontava o psolista Edmilson Rodrigues à frente de Zenaldo Coutinho, na disputa pela Prefeitura de Belém. Em outra ocasião, enquanto comemora a eleição de Zenaldo por 100 mil votos de diferença, “Jango” diz a Fabrício possuir um galpão que serviria para “algum tipo de projeto”, possivelmente, da prefeitura.

Em mais um telefonema, quando Fabrício se encontrava, segundo ele, “em uma inauguração com o governador”, Jango e um amigo dele garantem que o bairro do Jurunas vai eleger Fabrício deputado estadual. E há um diálogo para deixar qualquer um de orelha em pé. Nele, “Jango”, impaciente, dá ordens a Fabrício: “Vem logo aqui agora, agora! É pra vires pra cá agora, agora!”. E afirma: “Tô esperando vocês aqui já, com o negócio”. O “aqui” era a casa de “Jango”. E o “negócio”, qual seria?

E mais: os diálogos deixam impressão de que aquela não foi a única visita de Fabrício à casa de “Jango”. Ao contrário: aparentemente, foram vários os encontros entre os dois – um deles, logo depois de Fabrício deixar a companhia de Zenaldo e Jatene, que haviam acabado de jantar. Além disso, pelas conversas de “Jango” com outros interlocutores, até mesmo Zenaldo e Jatene deram uma passada na casa do suposto bicheiro, que os aguardava ansiosamente, durante a campanha eleitoral.

“O Zenaldo vai estar aqui na frente de casa daqui a 20 minutos”, diz “Jango” a um interlocutor, a quem pede que mande pelo menos “quatro do pessoal” para a frente da casa, a fim de recepcionar o candidato. O interlocutor acabara de mandar o “pessoal” almoçar, “porque a polícia tava pegando muito em cima da gente”. Daí que é possível que o “pessoal” fossem trabalhadores de campanha de rua, as chamadas “bandeiretes”, contratadas por Jango.

GRAVAÇÃO

Ao fundo dessa gravação ouve-se a propaganda de Zenaldo, oriunda de carro-som. Em outro telefonema, Jango manda um interlocutor se deslocar rapidamente à sua casa. “O Zenaldo tá vindo aqui na porta de casa agora, com o Jatene”, diz “Jango”. “Por isso que eu te liguei. Daqui a uns 10 minutos; é pra vir pra porta agora”.

CABO ELEITORAL

Outras conversas mostram “Jango” pedindo votos para Zenaldo, como um verdadeiro cabo eleitoral. Uma delas é com um cidadão de nome “Nelson” ou “Relson” – possivelmente, Relson Lima Souza, que, segundo a polícia, era quem entregava aos comandantes do Parazão o dinheiro lucrado com a jogatina - que era dividido em percentuais correspondentes às cotas de cada qual no “empreendimento”. Na conversa, “Jango” pergunta se Relson está trabalhando “pesadamente” na campanha de Zenaldo. Relson responde que sim e torce pela eleição do tucano. “Se Deus quiser, a porrada vai ser grande mesmo”, diz ele.

CARIPUNAS AMARELOU

Outro telefonema revela que pessoas sob o comando de “Jango” até ajudaram a “amarelar” as ruas de Belém durante a campanha de 2012. “Pegue um carro e vá lá na Caripunas, que o senhor vai ver o maior espetáculo que o senhor já viu. Nós deixamos a Caripunas amarela, mas tudinho”, conta um interlocutor, que chama “Jango” de “chefe”. E acrescenta, rindo: “E o senhor sabe quantas bandeiras nós pegamos de um carro aí, do PT? Duzentas e poucas”. Ao final, o homem diz a “Jango” que, naquele momento, estava “trabalhando” também na Pariquis. Em telefonema a uma mulher, “Jango” pede votos para Zenaldo e explica: “Nós tamos na política, num embate pra ajudar nosso candidato. É nosso interesse, é nossa amizade. É o Zenaldo”.

Jango diz que nunca tratou de política

Procurado pela reportagem do DIÁRIO na manhã do último sábado, Jango informou, por telefone conhecer Fabrício apenas pelo fato de ele ser presidente da Liga das Escolas de Samba de Belém.

“Fora isso, nunca tratei com ele sobre política ou campanha política”, afirmou o presidente de uma das mais tradicionais escolas de samba da capital paraense, Rancho Não Posso Me Amofiná. Já o número de Fabrício Gama, outra pessoa citada nas gravações obtidas pelo jornal junto à polícia civil, constava como “programado para não receber ligações”.

‘Jango’ Vidal

Apesar de ser considerado pela polícia “um bicheiro histórico”, “Jango” negou em depoimento qualquer ligação com a jogatina e disse que deixou de ser “cotista” do Parazão em 2005, após abrir a empresa de eventos JM Vidal. Mas certidões da Junta Comercial do Pará (Jucepa) anexadas ao inquérito mostram que “Jango” só deixou o Parazão em março de 2012, quando a “empresa” foi extinta – o cerco se fechava sobre o jogo do bicho, que, naquele ano, deixou de ser simples contravenção penal e virou crime.

Até o encerramento do Parazão, a “empresa” possuía 11 sócios e “Jango” era o segundo com o maior número de cotas: 15,22%, contra os 28,26% de José Manoel Lhamas Santos, irmão de criação do ex-deputado estadual e ex-prefeito de São João de Pirabas, Bosco Moysés, que morreu recentemente e era também considerado um “bicheiro histórico”. Outra certidão da Jucepa mostra que “Jango” foi sócio de Lhamas na “empresa” JB Loterias Ltda EPP, que encerrou atividades em fevereiro de 2013.

Durante a Efeito Dominó, a polícia apreendeu agenda de “Jango”, onde constam telefones fixos e celulares de vários artistas, jornalistas e radialistas e de pessoas supostamente ligadas ao jogo do bicho , além de políticos. Figura na relação um certo Fabrício Gama, com dois números de celulares e um fone fixo.

Fabrício Gama

Em 2012, Fabrício Pereira da Gama já era presidente do diretório municipal do PSDB de Belém, cargo para o qual foi reeleito no ano passado e cujo mandato vai até maio de 2015. Em 2011, foi nomeado assessor especial II do governador. Depois, tornou-se diretor geral da Fábrica Esperança, da qual foi afastado em setembro do ano passado. Em 2008, foi candidato a vereador pelo PSDB. Na campanha de 2012, chegou a ser fotografado nas ruas de Belém, em pleno dia, fazendo campanha para Zenaldo, apesar de então dirigir a Fábrica Esperança, que é administrada por uma Organização Social, mas recebe dinheiro dos cofres públicos estaduais.

Fabrício é, portanto, um quadro atuante do PSDB e com bastante trânsito junto a Jatene e, especialmente, a Zenaldo. No inquérito policial de mais de 3.700 páginas gerado pela operação Efeito Dominó, a polícia escreveu (e o Ministério Público reproduziu, ao denunciar à Justiça os supostos chefões do jogo do bicho em Belém): “Durante o período eleitoral, ficou clara a relação entre o denunciado [“Jango”] e Fabrício Gama, que seria presidente do diretório do PSDB, tendo inclusive afirmado que a referida pessoa seria candidato a deputado estadual, provavelmente custeado pela atividade ilegal”.

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